Sustentabilidade Empresarial: de quem é a responsabilidade?


A sustentabilidade corporativa deixou de ser um tema periférico para se tornar um eixo de competitividade, acesso a mercados e gestão de riscos. Em especial na América Latina, a combinação de pressão regulatória, exigências de cadeias globais de valor e expectativas de investidores vem reposicionando a agenda ESG como parte do núcleo da estratégia empresarial, e não apenas como ação de imagem ou filantropia. 

 

Para o empresariado local, essa mudança significa que a forma como a empresa organiza internamente a sustentabilidade influencia diretamente sua reputação, sua capacidade de atrair talentos e seu relacionamento com clientes e financiadores.

 

Um estudo da KPMG sobre Sustentabilidade na América Latina revela um cenário de avanço, mas também de fragmentação na governança do tema. Apenas 11% das empresas possuem uma área exclusiva de Sustentabilidade, 12% atribuem a pauta diretamente ao CEO, 16% ao CFO e 26% indicam a área de Responsabilidade Social como principal responsável. 

 

Esse quadro mostra que o tema já alcançou o topo da estrutura em parte relevante das organizações, mas ainda não se consolidou em um modelo único e maduro, permanecendo distribuído entre lideranças e departamentos com visões e mandatos distintos. Em vez de uma “propriedade” clara, observa-se um campo em disputa e em construção.

 

Essa percepção é reforçada por estudos regionais sobre reporte e governança ESG, que indicam que cerca de um quarto das empresas latino-americanas declara ter liderança de sustentabilidade em nível sênior – seja um executivo dedicado, seja um membro de conselho com essa atribuição – mas muitas ainda carecem de políticas formais e metas estruturadas. 

 

Dados da RSM algumas sub-regiões, pouco mais da metade das companhias afirma ter um Head de Sustentabilidade ou função equivalente, enquanto apenas cerca de 46% dizem possuir uma estratégia de sustentabilidade claramente definida. Isso sugere que, em muitos casos, a criação de cargos ou comitês ainda não se traduz, de maneira consistente, em integração da agenda ESG ao planejamento, ao orçamento e à tomada de decisão.

 

Além disso, o relatório da OCDE mostra que, apesar de 59% das empresas utilizarem remunerações variáveis ​​atreladas ao desempenho, apenas 27% vinculam esses incentivos a metas de sustentabilidade, evidenciando o início da integração do ESG nas práticas de governança e gestão executiva na região

 

No campo da governança corporativa e da remuneração executiva, análises recentes mostram um descompasso semelhante. Uma parcela majoritária das empresas da região já utiliza incentivos variáveis baseados em desempenho na remuneração da alta gestão, mas apenas uma fração menor vincula explicitamente esses incentivos a indicadores de sustentabilidade. 

 

Assim, ainda que CEO, CFO e outros executivos apareçam com frequência como responsáveis formais ou políticos pela pauta, o que efetivamente orienta sua agenda – metas, bônus, reconhecimento – nem sempre incorpora de forma clara objetivos ambientais, sociais e de governança. Do ponto de vista empresarial, isso significa que a sustentabilidade continua, muitas vezes, em posição concorrente com outras prioridades, em vez de ser tratada como parte intrínseca da performance do negócio.

 

Para o contexto de Uberlândia, com forte presença de setores de serviços, agro, logística e indústria, essa discussão tem implicações práticas imediatas. A associação da sustentabilidade à área de Responsabilidade Social é um movimento compreensível e, em muitos casos, positivo, já que essa função historicamente estruturou a relação com comunidades e o investimento social privado. No entanto, uma agenda ESG robusta exige que essa base se amplie para incluir gestão de riscos ambientais, conformidade regulatória, ética, integridade, diversidade e inclusão, bem como alinhamento com padrões internacionais. Em setores com maior impacto ambiental, isso requer conhecimento técnico específico em avaliação e mitigação de riscos, indo muito além de ações pontuais como projetos sociais ou iniciativas isoladas de eficiência energética.

 

Diante desse cenário, algumas recomendações se colocam aos empresários locais. Em primeiro lugar, definir com clareza quem coordena a agenda de sustentabilidade na empresa, garantindo a essa função acesso direto à direção e diálogo estruturado com finanças, operações, recursos humanos e jurídico.

 

 Em segundo lugar, formalizar uma política ou diretriz de sustentabilidade, ainda que sintética, que traduza princípios em prioridades, metas e indicadores mínimos, permitindo acompanhar avanços ao longo do tempo. 

 

Em terceiro lugar, iniciar, quando possível, a incorporação gradual de métricas ESG em uma parte da remuneração variável da liderança, sinalizando internamente que o tema é estratégico e não acessório. 

 

Por fim, investir em comunicação e educação interna, para que colaboradores compreendam o papel da empresa na transição para uma economia mais sustentável e levem práticas responsáveis também para o seu dia a dia, ampliando o impacto positivo sobre o território e fortalecendo a imagem de Uberlândia como polo de desenvolvimento alinhado à responsabilidade socioambiental.