A nossa [falta] de mobilidade de todos os dias


Por vezes, temos uma súbita vontade de criar uma máquina no tempo e consertar alguns erros que cometemos no passado. Quem sabe, compreender o motivo das administrações públicas tomarem certas decisões que repercutem drasticamente no presente.

 

A história conta que a decisão foi tomada anos atrás, quando JK, estabeleceu entre as suas metas de plano de governo “Cinquenta anos em cinco”, a fim de promover a industrialização do país. A indústria automobilística foi altamente alavancada e foi preciso investir intensivamente na construção de estradas pelo país. Até meados de 1940 e ainda nos anos 1950, os brasileiros utilizavam como principal meio para viagens de média e longa distância, os trens regionais. Claro, por questões de infraestrutura, a duração de um trajeto de 150 quilômetros durava seis horas. E foi justamente por este motivo que a rodovia ganhou espaço. Não esqueçamos que algumas metrópoles ofereciam serviços de bonde aos seus habitantes, e hoje as linhas estão desativadas, dando lugar aos espaçosos e poluentes ônibus. Os VLT’s (Veículos Leves sobre Trilhos), seus legítimos sucessores, amplamente utilizados nos países mais evoluídos, só agora começam a florescer por aqui.

 

O problema é que as políticas públicas dos governantes que vieram depois não caminharam no sentido de modernizar as ferrovias, como ocorreu na Europa, Japão e agora vemos a China, em seu plano decenal, que já está ligando a capital Beijing às suas 104 maiores cidades por meio de “trens bala” com velocidades acima de 300km/h.

Quem iria imaginar que plantamos, naquele período, a semente do monstro que nos consome? Sem dúvida, uma de nossas maiores dores de cabeça atuais é a falta de mobilidade urbana e de logística. De acordo com dados divulgados em 2012 pela Faculdade Getúlio Vargas (FGV), somente a cidade de São Paulo perde R$ 50 bilhões/ano em engarrafamentos diários, valor que dobra a cada quatro anos.

Não dá para fugir dos fatos. O Brasil, em sua grande essência, movido pelo transporte rodoviário - seja no transporte de passageiros ou no transporte de carga - não avança ou se quer busca logística mais eficiente e econômica.

 

Enquanto o trânsito nas metrópoles chega a picos de 300 quilômetros por dia (ou mais), nas estradas os caminhoneiros levam 20 horas para entregar uma única carreta. O trem, por outro lado, consegue transportar 200, 300 vagões numa única composição. Neste caso, falamos de trajetos que não excedem mil quilômetros.

 

Logo, colocar toda essa responsabilidade nas mãos de um caminhoneiro é desumano. Logisticamente, o ideal para estes profissionais seria transportar cargas em percursos de até 300 quilômetros, no máximo.

 

Outro estudo, revelado este ano pela Secretaria da Casa Civil, mostra que rodovias como Anhanguera e Anchieta, se nada for feito, vão travar em meados de 2030, a ponto de se tornarem “estacionamentos a céu aberto”.

 

A principal ideia concebida nos setores de logística no Brasil e no mundo é que não existe um melhor modal e sim uma harmonia sincronizada entre todos eles. Não podemos colocar todas as nossas esperanças em um único transporte, pois é certeiro que apareça gargalos.

 

Outra alternativa de meio de transporte importante, mais barato e de menor impacto ecológico é as hidrovias. Ainda pouco contemplada com políticas de governos e de uso rudimentar, dependendo das sazonalidades das chuvas.

 

A ferrovia, entretanto, é a única que pode carregar grandes quantidades de produtos e pessoas do ponto A ao B com eficiência e rapidez. Na parte de cargas, os caminhões fazem a ponta de entrega até os portos ou armazéns; na parte de passageiros, os metrôs, VLT’s ônibus e táxis se encarregam do destino final do usuário.

 

Estudos apontam que o transporte ferroviário necessita 20 vezes menos espaço do que outros modais. Ou seja, um único trem tem capacidade para transportar 80 mil passageiros/ hora, enquanto ônibus e automóveis conseguem apenas 6,7 mil e 1,8 mil pessoas, respectivamente. Os fatos não mentem.

 

Porém, para a ferrovia voltar ao seu devido lugar, é preciso fomentar um salto tecnológico no setor com políticas públicas arrojadas  e investimentos de grande ordem em infraestrutura, construir linhas, sinalização, locomotivas, carros de metrô e na  preparação de profissionais capacitados. Tais iniciativas só serão viáveis com a adoção de modernos dispositivos institucionais que permitam a participação conjunta de governo e empreendedores privados por meio de concessões ou PPP( Parcerias Público Privadas) como ocorre noutros setores.

 

Feito isso, minimiza-se o tão mencionado “Custo Brasil”. Havendo logística concisa, elimina-se os gargalos e ganha-se eficiência. Quer exemplo melhor do que os Estados Unidos, onde 50% da carga transportada vai por trilhos ou dos países europeus e asiáticos que harmonizam a utilização dos vários modais? E olha que lá, mesmo com tanta modernidade eles sofrem muito com os congestionamentos urbanos. Imaginem só o que vai acontecer se nada for feito?

 

É hora de refletir ... e agir !